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PEC 45: para a emenda não sair pior que o soneto

A aprovação pela Câmara dos Deputados da Reforma Tributária (PEC nº 45/2019) foi um importante passo em direção ao aprimoramento do nosso sistema de cobrança de impostos, famoso por sua barroca complexidade. Contudo, pouco tempo depois da histórica votação, ficou patente a necessidade de alguns ajustes, sob pena de a emenda poder sair pior que o soneto.

Logo saltou aos olhos dos especialistas o risco de que o Brasil venha a ter a maior alíquota incidente sobre o consumo no mundo: 28,04%, segundo nota técnica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Consequência direta da ação dos grupos de interesse, que pressionam para pagar menos que o comum dos mortais.

Aqui não há mágica a se fazer. É matemática: para que não haja perda de arrecadação, quanto mais exceções, mais elevada a taxação a ser suportada pelos demais setores. Reavaliar a enxurrada de tratamentos diferenciados é, portanto, tarefa que se impõe. Mas não basta apenas buscar uma tributação mais homogênea dos segmentos que já são alcançados pelos impostos atuais. Dentro do conceito de base ampla da reforma, é necessário que esta não reproduza os mesmos pontos cegos do modelo hoje vigente.

Vale notar que o texto da PEC, ainda que timidamente, não deixa de realizar um movimento nesse sentido, ao colocar como fato gerador do futuro Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) também as operações em que estes sejam imateriais. Outra inovação positiva é a possibilidade de se definir como sujeito passivo do tributo pessoa que concorra para a realização da operação, mesmo que domiciliada no exterior. Ambas previsões em linha com as recomendações de combate à elisão fiscal feitas por organismos internacionais, como o G20 e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

No entanto, faltam dispositivos que tornem essa política menos programática e mais efetiva. Uma alteração que talvez possa ajudar a esse respeito seria fazer incidir expressamente o novo tributo nas operações de leasing importação. Ideia semelhante, aliás, já foi tentada pelo Senado Federal em relação ao ICMS, por ocasião da PEC nº 150/2015.

Se, em questões como essa, a reforma não deixa de apontar rumos interessantes, em outros trechos, ela se mostra absolutamente indefensável. Alguns deles: o longuíssimo período de transição (em que o contribuinte terá de conviver com nada menos que nove tributos ao mesmo tempo!), os polêmicos superpoderes do colegiado gestor do IBS (maiores que o de qualquer governador) e o “socialismo fiscalizatório” (em que um estado multa, mas o dinheiro é dividido com toda a federação).

Que o relator da matéria, o senador Eduardo Braga, consiga aparar essas arestas. E, quanto aos pontos mais controversos, que não se furte a ouvir o conselho do poeta Bocage: às vezes, é melhor começar tudo de novo que emendar obra nascida torta.

 

Fonte: https://www.jb.com.br/brasil/opiniao/artigos/2023/08/1045667-pec-45-para-a-emenda-nao-sair-pior-que-o-soneto.html

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